Tanto para explicar o terremoto e o consequente tsunami, como para esmiuçar o que tem ocorrido – bem como o que pode ocorrer – na usina nuclear de Fukushima, os diferentes veículos de comunicação não têm poupado esforços em descrever, por exemplo, como podem se deslocar as placas tectônicas ou funciona um reator nuclear. Ainda que se tente evitá-los, naturalmente termos técnicos vêm à tona, e acabamos nos acostumando, mesmo que de forma temporária, com nomes de elementos químicos pouco conhecidos e denominações de processos que em geral nos parecem, ao menos num primeiro momento, muito complicados.
É aí que emerge um outro perigo – claro, infinitamente menor que aqueles relacionados de maneira direta aos fatos, mas que não deixa de ser importante. Visto que qualquer tentativa de comunicação é marcada por um constante oscilar entre elucidações e lacunas – enfim, nem tudo o que se procura transmitir é absorvido ou interpretado tal qual se pretendia –, o que é especialmente impactante quando se trata de ciência, uma única palavra ou expressão mal colocada pode botar em risco o entendimento sequer das informações principais do conteúdo que vem a público.
Senti um breve mas razoável calafrio quando vi estampada em manchete de um grande jornal a palavra “fusão”, dentro do noticiário referente aos eventos destes últimos dias no Japão. Nada a ver com fusão nuclear, processo pelo qual dois núcleos de átomos se juntam para formar um núcleo de número atômico maior, algo que ocorre nas estrelas, mas apenas em escala experimental incipiente no que diz respeito a geração estável de energia elétrica. (O que ocorre nas usinas nucleares é outro processo, o de fissão, em que núcleos são “quebrados”, liberando energia e resultando em átomos de elementos mais leves.) A fusão em questão é aquela que pode ser tomada como sinônimo de derretimento – no caso, dos reatores em Fukushima, o que parece, até prova em contrário, não ter ocorrido – e ficava claro no texto, embora somente para olhares mais atentos, que a palavra em nada remetia à união de átomos.
Houvesse uma fusão nuclear de fato (o que seria praticamente impossível nas usinas atuais, em função da natureza dos elementos utilizados), as consequências poderiam ser gravíssimas, haja vista o fato de esse processo já ter sido empregado em bombas de alto poder destrutivo, como a de hidrogênio, mais conhecida como bomba H, nunca usada para valer. Mas não deu outra! Não tardou para que a seguinte chamada pipocasse em sites de notícias, como os do Uol, Terra e Último Segundo: “Autoridades japonesas não descartam fusão nuclear em usina de Fukushima”.
Que Deus – para aqueles que nele acreditam –, a Mãe Natureza, o Acaso ou o Imponderável nos livrem de tragédias como a que se abateu sobre os japoneses. E que o bom senso e o discernimento de nossos jornalistas e divulgadores de ciência se façam presentes e venham a nos afastar de informações com erros grosseiros como esse.
Nenhum comentário:
Postar um comentário