segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Destaque do mês (outubro de 2011)

Ciência em mosaico

Transdisciplinaridade: ruptura de paradigmas?

me disseram que escrevo muito, neste blog, sobre ciência, mas praticamente nada sobre transdisciplinaridade. Numa certa perspectiva, não lhes tiro a razão – e basta fazer um levantamento nas postagens para se chegar a essa constatação.

De qualquer modo, sempre que posso, e isso talvez se com certa frequência, procuro tratar a ciência, ou o fato relativo ao mundo científico, com uma visão transdisciplinar, ainda que não use este adjetivo ou o substantivo correspondente. E para isso também basta fazer uma pesquisa no blog e verificar em que medida venho tratando a ciência pela ciência ou, ao contrário, relacionando-a a outros campos da vida, como a sociedade, a educação, a arte ou a religião.

Para que entendam melhor como penso a transdisciplinaridade, recomendo a leitura do artigoTransdisciplinaridade: ruptura de paradigmas?”, publicado na edição nº 3 da revista eletrônica Leitura e Escritura, da qual sou editor. Nele, não apenas discorro sobre o assunto, dialogando com as ideias de tradição e método científico, como igualmente questiono a maneira como o conceito de transdisciplinaridade, em princípio tão ousado e inovador, vem sendo em geral apresentado, sem que se proponham significativas modificações nos paradigmas vigentes ou a instauração de um autêntico novo paradigma.

Embora hoje eu talvez viesse a alterar um ou outro trecho, ou até adotar uma linha diferente de raciocínio, o texto, que foi originalmente publicado na revista eletrônica Espiral, do Núcleo José Reis de Divulgação Científica, e depois num livro desse mesmo centro de pesquisas, me propiciou o prazer de receber feedbacks positivos (foi inclusive reproduzido num grupo de discussão sobre Paramahansa Yogananda, citado no artigo), indicando que vale a pena prosseguir tratando desse instigante tema.

Fico no aguardo de comentários e colaborações, incluindo críticas que venham a ser construtivas.

Terra, 7 bilhões

Chegamos a 7 bilhões de habitantes. Há cem anos, sequer chegávamos a 2 bilhões. Não poucos dirão, com certa razão, que tal salto se deu muito em função dos avanços da medicina e das melhorias das condições sanitárias, entre outras, ou, enfim, do progresso da ciência e de outros campos da atuação humana, do século XX para cá.

Não vejo, porém, muito o que comemorar. A maioria dos que nascem hoje, ou seja, a maior parte dos que contribuem para que avancemos rumo ao oitavo bilhão de residentes na Terra, está em países que ou se encontram em condições miseráveis de vida, como muitos – ou quase todos – da África, ou não conseguiram ainda superar os enormes contrastes entre seus grupos sociais, caso da Índia. Portanto, simplesmente atribuir a evolução quantitativa de nossa população à medicina, à ciência ou ao progresso implica aceitar uma intrincada contradição.

Cada ser humano que habita este planeta é um universo à parte. E um universo cujos potenciais só poderão aflorar se tiver saúde, educação, segurança e habitação em níveis minimamente dignos – o que não ocorre a bilhões dentre os 7 bilhões hoje alcançados.

Só haverá motivos para festa quando chegarmos a zero: zero passando fome, zero morrendo de doenças cuja existência nos é razão de vergonha, zero sem saber escrever ou se expressar com o mínimo de fluência, zero sofrendo qualquer forma de violência de seu próprio semelhante, zero morando nas ruas ou em outros locais insalubres, zero vítimas de injustiças inconcebíveis ou de tragédias que poderiam ser evitadas... e tantos outros zeros que os séculos custarão a presenciar.

O bruxo de Itabira

Tenho predileção pelo bruxo do Cosme Velho (Machado de Assis), e também uma leve preferência pela prosa em relação à poesia – ainda que já tenha feito algumas e aprecie a escrita em versos –, mas faço aqui uma breve homenagem a outro mestre da literatura, poeta por excelência, nascido há 109 anos, em Itabira, Minas Gerais, neste dia em que se celebram as bruxas: Carlos Drummond de Andrade.

Sua escrita, cheia de suavidade e simplicidade, nos tirou muitas pedras do caminho, mostrando que não é preciso seguir fórmulas, usar de palavras pouco conhecidas ou ter uma métrica perfeita para se fazer excelente poesia. Não rejeito, como muitos fazem, os luminares parnasianos ou simbolistas, adeptos dessas práticas, mas não há de se negar a importância de Drummond na tarefa de arejar nossa literatura, dando-lhe um novo ânimo e novos rumos a seguir.

Por essas e outras, temos de reconhecer que o poeta mineiro (ou meio mineiro, meio carioca), tal qual Machado, também fazia suas bruxarias com as palavras. Para ele, nem a festa acabou, nem a luz muito menos se apagou.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Música e enfermagem

Foi lançado no último dia 21 o livro Enfermagem e as práticas complementares em saúde, organizado por Léia Fortes Salles e Maria Júlia Paes da Silva, pela Yendis Editora.

Neste momento não posso dizer nada sobre o livro como um todo, mas um dos capítulos, intitulado “Música e enfermagem: um recurso integrativo”, é assinado pela amiga Eliseth Ribeiro Leão, em coautoria com Maria Fernanda Zorzi Gatti, Ana Claudia Puggina e Ana Paula de Almeida.

Eliseth, doutora em Ciências pela Escola de Enfermagem da USP, com pós-doutorado pela Universidade Marc Bloch, de Strasbourg (França), foi minha aluna na primeira turma do curso de redação Leitura e Escritura da Divulgação Científica, em 2004, e tive o prazer de reencontrá-la em maio do ano passado, quando, a seu convite, ministrei palestra sobre meios de comunicação e cuidados paliativos, no II Simpósio Internacional de Enfermagem, promovido pelo Hospital Samaritano de São Paulo.

Coordenadora de Responsabilidade Social e de Ciência, Educação e Cultura nesse hospital, conduz desde 2003 o projeto “Uma canção no cuidar”, em que a música é usada como complemento aos tratamentos de saúde dos pacientes do Samaritano.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Do oitenta ao oito

O último fim de semana foi curioso jornalisticamente, em específico na Folha de S.Paulo. Em primeiro lugar, tanto no sábado como no domingo, as manchetes de capa tinham a ver com ciência, ainda que não de modo direto e fulcral.

No dia 15, ostentava-se o horror: “Lixo hospitalar dos EUA é vendido em loja no país”, expondo o inominável e abominável episódio em que lençóis usados, provenientes de hospitais norte-americanos, foram encontrados à venda no interior de Pernambuco – episódio este que já alcançou o noticiário televisivo, com grande destaque durante a semana. A Folha, enfim, célebre por suas denúncias no campo da política, desta vez prestou um singular serviço ao país ao revelar um caso grave na área de saúde pública.

O domingo, 16 de outubro, por sua vez, mostrou uma Folha estranha aos meus olhos, com manchete muito pouco crítica, pelo contrário, um tanto laudatória em relação aos investimentos públicos e particulares numa das principais regiões do Brasil: “Amazônia vira motor de desenvolvimento”. No lide (parágrafo inicial), um texto que caberia melhor em peças publicitárias do que no jornalismo: “O governo e o setor privado inauguraram novo ciclo de desenvolvimento e ocupação da Amazônia Legal”. Apenas no final do texto de capa faz-se uma ressalva relativa à controvérsia entre ambientalistas, associada à informação de que diminuíram os gastos com conservação.

Os textos no interior do jornal mostram um pouco mais de equilíbrio entre as questões do investimento e da preservação ambiental, ainda que o destaque seja para a primeira vertente.

De qualquer modo, a presença, na Folha, de manchetes de capa desse teor constituíram, ainda que sem qualquer intenção, um bom prenúncio para a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, iniciada na segunda-feira seguinte e a se encerrar no próximo domingo, dia 23. Pena que ficou só no prenúncio, pois até o momento a Semana tem sido praticamente ignorada pela grande imprensa.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Scientists in Comics

Nesta Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, iniciada ontem (17/10), cujo tema é “Mudanças climáticas, desastres naturais e prevenção de riscos”, com milhares de atividades programadas para até domingo, dia 23, em todo o país, meu destaque vai para a exposição de pôsteres com tiras dos “Cientistas em Quadrinhos”, de João Garcia, o Jão, no saguão do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, na Cidade Universitária, capital paulista.

A exposição, que se encerra no dia 20, faz parte do Simpósio Brasil-Índia – Construindo redes de conhecimento através da Universidade de São Paulo. Também serão expostos quadrinhos do indiano Pradeep Kumar e de outro brasileiro, Sthar-Mar Vasconcelos.

Conheci João Garcia há alguns anos, no Núcleo José Reis de Divulgação Científica. Jornalista, assessor de imprensa do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo), é das pessoas mais simpáticas que conheci, com humor refinadíssimo – o que se traduz em suas tiras e cartuns, versando sobre diferentes temas da ciência, muitas vezes com um ou outro toque de ironia e crítica, seja à burocracia presente nas atividades de pesquisa, seja à própria maneira de agir de não poucos cientistas, entre outros aspectos. É divulgação científica de primeira.

Algumas de suas tiras ( vi muitas) são simplesmente impagáveisembora eu tenha certeza de que, com seu excelente humor, ele diria preferir que fossem (bem) pagáveis. Abaixo, um dos quadrinhos presentes no blog Os Cientistas em Quadrinhos (http://oscientistashq.blogspot.com/), e em inglêspela primeira vez as personagens de João Garcia aparecem em versão bilíngue.